Tradição
Havia uma vez uma cidade formada por duas ruas paralelas. Um
dervixe passou de uma rua para a outra, e assim que a alcançou, as pessoas
notaram que havia lágrimas nos olhos dele.
“Morreu alguém na outra rua!”, gritou um homem e logo as
crianças da vizinhança fizeram coro a essa exclamação.
Mas o que acontecera fora algo muito diferente. O dervixe
estivera descascando cebolas. Em poucos segundos o eco do grito já alcançara a
primeira das duas ruas. E os adultos de ambas se preocuparam e ficaram tão
assustados que não se animaram a investigar devidamente as causas daquela
agitação. Um homem sensato e sábio tentou chamar à razão as pessoas das duas
ruas, indagando-lhes por que não se comunicavam para apurar o acontecido. Muito
confusos para apreender o sentido daquelas palavras, alguns disseram:
“Pelo que entendemos há uma epidemia muito séria na outra
rua.”
Esse boato também se propagou como um incêndio
incontrolável, levando a população daquela rua a pensar que a outra estava
destinada a morrer.
Quando foi possível restabelecer certa ordem, ambas as
comunidades só pensaram numa saída: emigrarem para salvar-se. E foi assim que,
de repente, as duas ruas ficaram vazias de seus habitantes.
Ainda hoje, vários séculos passados, a cidade permanece
deserta, e não muito distante dali há duas aldeias. Cada uma possui sua própria
tradição, sendo que ambas estabeleceram a partir de um povoado construído por
pessoas fugidas de uma cidade condenada por um mal desconhecido, em tempos
remotos.
(Conto sufi)
Ilha
Certa vez um homem muito rico, de natureza boa e generosa,
queria que o seu escravo fosse feliz. Para isso lhe deu a liberdade e um navio
carregado de mercadorias.
“Agora você está livre. disse o homem. Vá e venda esses
produtos em diversos países e tudo o que conseguir por eles será seu.”
O escravo liberto embarcou no navio e viajou através do
imenso oceano. Não havia viajado muito tempo quando caiu uma tempestade. O
barco foi arremessado violentamente contra os rochedos e se fez em pedaços.
Tudo o que havia a bordo se perdeu.
Somente o ex-escravo conseguiu se salvar, porque, a nado,
pôde alcançar a praia de uma ilha próxima.
Triste, abatido e só, nu e sem nada, o ex-escravo caminhou
até chegar a uma cidade grande e bonita. Muita gente se aproximou para
recebê-lo, gritando: “Bem-vindo! Bem-vindo! Longa vida ao rei!”
Trouxeram uma rica carruagem, onde o colocaram e
escoltaram-no até um magnífico palácio.
Lá muitos servos se reuniram ao seu redor, vestiram-no com
roupas reais e todos se dirigiam a ele como soberano, em total obediência à sua
vontade.
O ex-escravo, naturalmente, ficou feliz e, ao mesmo tempo,
confuso. Ele desejava saber se estava sonhando ou se tudo o que via, ouvia ou
experimentava não passava de uma fantasia passageira.
Convenceu-se, finalmente, de que o que estava acontecendo
era real. E perguntou a algumas pessoas que o rodeavam, de quem gostava, como
havia chegado àquela situação.
“Afinal, disse. Sou um homem de quem vocês nada conhecem, um
pobre e despido vagabundo que nunca viram antes. Como podem transformar-me em
seu governante? Isto me causa muito mais espanto do que possa dizê-lo.”
“Senhor, responderam. Esta ilha é habitada por espíritos. Há
muito tempo eles rezaram para que lhes fosse enviado um filho do homem para
governá-los, e suas preces foram ouvidas. Todos os anos é enviado um filho do
homem. Eles o recebem com grande dignidade e o colocam no trono. Porém seu
'status' e seu poder acabam quando se completa o ano. Então lhe tiram as vestes
reais e o põe a bordo de um barco que o leva para uma grande ilha deserta. Lá,
a não ser que antes tenha sido sábio e tenha se preparado para esse dia, não
encontra amigos, não encontra nada: vê-se obrigado a passar uma vida
aborrecida, solitária e miserável. Elege-se então um novo rei, e assim acontece
ano após ano. Os reis que o antecederam foram descuidados e não pensaram.
Desfrutaram plenamente do seu poder, esquecendo- se do dia em que tudo
acabaria.
Essas pessoas aconselharam ao ex-escravo a ser sábio e permitir
que suas palavras permanecessem dentro do seu coração.
O novo rei ouviu tudo atentamente, e lamentou ter perdido o
pouco tempo que havia passado desde que chegara à ilha. Pediu ao homem de
conhecimento que havia falado: “Aconselhe-me, ó Espírito da Sabedoria, como
devo preparar-me para os dias que chegarão no futuro”.
“Nu você chegou até nós, disse o homem, e nu será enviado à
ilha deserta da qual lhe falei. Agora você é rei e pode fazer o que quiser. Por
isso mande trabalhadores à ilha e permita-lhes que construam casas, preparem a
terra e tornem belas as redondezas. Os terrenos áridos devem ser transformados
em campos frutíferos. As pessoas deverão ir viver lá e você estabelecerá um
reino para si mesmo. Seus próprios súditos estarão esperando quando você chegar
para dar-lhe as boas-vindas. O ano é curto, o trabalho é longo: seja diligente
e enérgico.”
O rei seguiu o conselho. Mandou trabalhadores e materiais
para a ilha deserta, e antes de findar a vigência de seu poder a ilha se
transformou num lugar fértil, aprazível e atraente.
Os governantes que o tinham precedido haviam antecipado o
fim de seu tempo com medo, ou afastavam este pensamento se divertindo. Ele,
porém, o aguardava com alegria, uma vez que então poderia começar sobre uma
base de paz permanente e felicidade.
O dia chegou. O escravo liberto que tinha sido feito rei foi
despojado de sua autoridade.
Ao perder seus trajes reais, perdeu também seus poderes.
Nu, foi colocado num barco, e as velas inflaram em direção à
ilha, porém quando se aproximou da praia as pessoas que tinham sido enviadas
antes para lá vieram para recebê-lo com música, canções e muita alegria.
Fizeram- no seu governante, e ele viveu em paz.
(Conto sufi)
Imperador
O imperador Mahmud El-Ghazna passeava um dia com o sábio
Ahmad Mussain, que tinha reputação de ler pensamentos.
O imperador, há algum tempo, vinha tentando que o sábio
fizesse diante dele uma demonstração de sua capacidade.
Como Ahmad se recusava a fazer a sua vontade, Mahmud havia
decidido recorrer a um ardil para que o sábio, sem o perceber, exercesse seus
extraordinários dotes na sua presença.
“Ahmad!”, chamou o imperador.
“Que desejas, senhor?”
“Qual é o ofício do homem que está perto de nós?”
“É um carpinteiro.”
“Como se chama?”
“Ahmad, como eu.”
“Será que comeu alguma coisa doce recentemente?”
“Sim, comeu.”
Chamaram o homem e ele confirmou tudo o que o sábio havia
dito.
“Tu, disse o imperador, te recusaste a fazer uma
demonstração dos teus poderes na minha presença. Percebeste que te forcei, sem
que o notasses, a demonstrar tua capacidade, e que o povo te transformaria num
santo se eu contasse em público as revelações que me fizeste? Como é possível
que continues ocultando a tua condição de sufi e pretendas passar por um homem
qualquer?”
“Admito que posso ler pensamentos, concordou Ahmad; mas o
povo não percebe quando faço isso. Minha dignidade e meu amor-próprio não me
permitem exercer esse dom com propósitos frívolos. Por isso meu segredo
continua ignorado.”
“Mas admites que agora mesmo acabas de usar teus poderes?”
“Não, absolutamente não.”
“Então como pudeste responder minhas perguntas corretamente?”
“Facilmente, senhor. Quando me chamaste, esse homem virou a
cabeça, o que me indicou que seu nome era igual ao meu. Deduzi que era
carpinteiro porque, neste bosque, só dirigia o olhar para árvores
aproveitáveis. E sei que acabara de comer alguma coisa doce, porque vi que
estava espantando as abelhas que procuravam pousar nos seus lábios. Lógica, meu
Senhor. Nada de dons ocultos ou especiais.”
(Conto sufi)
Nasrudin
Mulla Nasrudin (Khawajah Nasr Al-Din) viveu no século XIV.
Contou e escreveu histórias onde ele próprio era personagem. São histórias que
atravessaram fronteiras desde sua época, enraizando-se em várias culturas. Elas
compõem um imenso conjunto que integra a chamada Tradição Sufi, ou o Sufismo,
seita religiosa de antiga tradição persa e que se espalha pelo mundo até hoje.
(Conto sufi)
Barco
Nasrudim às vezes levava as pessoas para viajar em seu
barco.
Um dia, um pedagogo exigente contratou-o para transportá-lo
ao outro lado de um rio muito largo. Assim que se lançaram à água, o sábio perguntou-lhe
se faria mau tempo: “não me pergunte nada sobre isto”, disse Nasrudim.
“Você nunca estudou gramática?”
“Não!”
“Neste caso, metade de sua vida foi desperdiçada."
O Mulla não disse nada. Logo desabou uma terrível
tempestade. O pequeno e desorientado barco de Mulla começou a encher de água.
Ele se inclinou para o companheiro.
“Alguma vez você aprendeu a nadar?”
“Não!”, respondeu o pedante.
“Neste caso, caro mestre, toda sua vida foi desperdiçada,
pois estamos afundando.”
(Conto sufi)
Desejos
A festa reuniu todos os discípulos de Nasrudin. Comeram e
beberam durante muitas horas, sempre a conversar sobre a origem das estrelas e
dos propósitos da vida. Quando já era quase de madrugada, preparavam-se todos
para voltar para as suas casas. Restava um belo prato de doces sobre a mesa.
Nasrudin obrigou os seus discípulos a comê-lo.
Um deles, porém, recusou: “o mestre está-nos a testar. Quer
ver se conseguimos controlar os nossos desejos. “
“Estás enganado. A melhor maneira de dominar um desejo é
vê-lo satisfeito. Prefiro que vocês fiquem com o doce no estômago do que no
pensamento, que deve ser usado para coisas mais nobres.”
(Conto sufi)
Ovo
Certa manhã, Nasrudin colocou um ovo embrulhado num lenço,
foi para o meio da praça da sua cidade e chamou aqueles que estavam ali.
“Hoje vamos ter um importante concurso! A quem descobrir o
que está embrulhado neste lenço eu dou de presente o ovo que está dentro!”
As pessoas se olharam, intrigadas, e responderam: “como
podemos saber? Ninguém aqui é capaz de fazer esse tipo de previsões!”
Nasrudin insistiu: “O que está neste lenço tem um centro que
é amarelo como uma gema, cercado de um líquido da cor da clara, que por sua vez
está contido dentro de uma casca que se parte facilmente. É um símbolo de
fertilidade, e lembra-nos dos pássaros que voam para seus ninhos. Então, quem é
que me pode dizer o que está aqui escondido?”
Todos os habitantes pensavam que Nasrudin tinha nas suas
mãos um ovo, mas a resposta era tão óbvia, que ninguém resolveu passar vergonha
diante dos outros.
E se não fosse um ovo, mas algo muito importante, produto da
fértil imaginação mística dos sufis? Um centro amarelo podia significar algo do
sol, o líquido em seu redor talvez fosse um preparado alquímico. Não, aquele
louco estava a querer fazer alguém passar por ridículo.
Nasrudin perguntou mais duas vezes, e ninguém respondeu.
(Com sufi)
Casamento
Nasrudin estava proseando com um conhecido , que lhe
indagou: “ Mullah, responda-me, você nunca pensou em se casar?”
“Sim, claro que já. Quando eu era jovem, determinei-me a
achar o meu par perfeito. Cruzei o deserto, cheguei em Damasco, e conheci uma
mulher belíssima e espiritualmente muito
evoluída; mas as coisas triviais, do dia a dia, a atrapalhavam. Mudei de rumo e
lá estava eu, em Isfahan; ali pude conhecer uma mulher com dom para as coisas
materiais, da vida caseira, e além disso se mostrou muito espiritualizada.
Porém, carecia de beleza física. Pensei: o que fazer? E resolvi ir ao Cairo. Lá
cheguei e logo fui apresentado a uma linda jovem, que também era religiosa, boa
cozinheira e conhecedora dos afazeres do lar. Ali estava a minha mulher ideal.
Entretanto você não se casou com ela. Por quê?”
“Ah, meu prezado amigo, ela também estava buscando o homem
ideal.”
(Com sufi)
Contrabandista
Volta e meia, Nasrudin atravessava a fronteira entre a
Pérsia e a Grécia montado no lombo de um burro. Toda vez passava com dois
cestos cheios de palha e voltava sem eles, arrastando-se a pé. Toda vez o
guarda procurava por contrabando. Nunca o encontrou.
“O que é que você transporta, Nasrudin?”
“Sou contrabandista."
Anos mais tarde, com uma aparência cada vez mais próspera,
Nasrudin mudou-se para o Egito. Lá encontrou um daqueles guardas de fronteira.
“Diga-me, Mullá, agora que você está fora da jurisdição
grega e persa, instalado por aqui nesta vida boa: o que é que você contrabandeava,
que nunca conseguimos pegar?”
“Burros.”
(Conto sufi)
Felicidade
Nasrudin encontrou um homem desconsolado sentado à beira do
caminho e perguntou-lhe os motivos de tanta aflição: “ Não há nada na vida que
interesse, irmão. Tenho dinheiro suficiente para não precisar trabalhar e estou
nesta viagem só para procurar algo mais interessante do que a vida que levo em
casa. Até agora, eu nada encontrei.”
Sem mais palavra, Nasrudin arrancou-lhe a mochila e fugiu
com ela estrada abaixo, correndo feito uma lebre. Como conhecia a região, foi
capaz de tomar uma boa distância.
A estrada fazia uma curva e Nasrudin foi cortando o caminho
por vários atalhos, até que retornou à mesma estrada, muito à frente do homem
que havia roubado. Colocou a mochila bem do lado da estrada e escondeu-se à
espera do outro. Logo apareceu o miserável viajante, caminhando pela estrada
tortuosa, mais infeliz do que nunca pela perda da mochila. Assim que viu sua
propriedade bem ali, à mão, correu para pegá-la, dando gritos de alegria.
“Essa é uma maneira de se produzir felicidade”, disse Nasrudin.
(Conto sufi)
Conversa
Nasrudin, certa vez, estava sem um burrico que o ajudasse em
seus afazeres.
Desesperado, sem ter meios de encontrar um, começou a orar,
pedindo a Deus que lhe enviasse um burrico.
Rezou por algum tempo e, certo dia, ao andar por uma
estrada, deparou-se com um homem montado num burrico e atrás levava um outro
burrico mais jovem.
Nasrudin aproximou-se do homem e este lhe disse: “mas que
vergonha, eu estou trazendo um burrico de tão longe, estamos todos esgotados, e
aqui está este homem descansado, sem fazer nada!”
E ameaçando-o com uma espada, completou: “vamos! Coloque o
burrico nas suas costas e venha comigo até a próxima cidade!”
Nasrudin, com medo não disse nada, simplesmente colocou o
burrico em suas costas e seguiu o homem. Andaram por várias horas e Nasrudin
estava exausto de tanto peso.
Ao entardecer, chegaram na cidade mais próxima e o homem
simplesmente fez Nasrudin descer o burrico das suas costas e seguiu adiante,
sem sequer agradecer.
Nasrudin ergueu os seus olhos para o céu e disse: “está bem,
Deus. Aprendi a minha lição. Na próxima vez serei mais específico... “
(Conto sufi)
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Nasrudin postou-se na praça do mercado e dirigiu-se à
multidão: “ó povo deste lugar! Querem conhecimento sem dificuldade, verdade sem
falsidade, realização sem esforço, progresso sem sacrifício?”
Logo juntou um grande número de pessoas, com todo mundo
gritando: “queremos! queremos!”
“Excelente! Era só para saber. Podem confiar em mim, que
lhes contarei tudo a respeito, caso algum dia descubra algo assim.”
(Conto sufi)
Luz
Alguém viu Nasrudin procurando alguma coisa no chão.
"O que é que você perdeu, Mullá?", perguntou-lhe.
"Minha chave", respondeu o Mullá.
Então, os dois se ajoelharam para procurá-la. Um pouco
depois, o sujeito perguntou: "onde foi exatamente que você perdeu esta
chave?"
"Na minha casa."
"Então por que você está procurando por aqui?"
"Porque aqui tem mais luz."
(Conto sufi)
Visita
O célebre e contraditório personagem sufi Mulla Nasrudin
visitou a Índia.
Chegou a Calcutá e começou a passear por uma de suas
movimentadas ruas.
De repente viu um homem que estava vendendo o que Nasrudin
acreditou que eram doces, ainda que na realidade fossem chiles apimentados.
Nasrudin era muito guloso e comprou uma grande quantidade
dos supostos doces, dispondo-se a dar-se um grande banquete. Estava muito
contente, se sentou em um parque e começou a comer chiles às dentadas.
Logo que mordeu o primeiro dos chiles sentiu fogo no
paladar. Eram tão apimentados aqueles "doces" que ficou com a ponta
do nariz vermelha e começou a soltar lágrimas até os pés.
Não obstante, Nasrudin continuava levando os chiles à boca
sem parar. Espirrava, chorava, fazia caretas de mal estar, mas seguia devorando
os chiles. Assombrado, um passante se aproximou e disse-lhe:
“Amigo, não sabe que os chiles só se comem em pequenas
quantidades?”
Quase sem poder falar, Nasrudin comentou: “bom homem,
creia-me, eu pensava que estava comprando doces. “
Mas Nasrudin seguia comendo chiles e o passante disse: “bom,
está bem, mas agora já sabes que não são doces. Por que segues comendo-os? “
Entre tosses e soluços, Nasrudin disse: “Já que investi
neles meu dinheiro, não vou jogá-los fora. “
(Conto sufi)
Sermão
Certo dia, os moradores do vilarejo quiseram pregar uma peça
em Nasrudin. Já que era considerado uma espécie meio indefinível de homem
santo, pediram-lhe para fazer um sermão na mesquita.
Ele concordou.
Chegado o tal dia, Nasrudin subiu ao púlpito e falou: “ó
fiéis! Sabem o que vou lhes dizer?”
“Não, não sabemos””
“Enquanto não saibam, não poderei falar nada. Gente muito
ignorante, isso é o que vocês são. Assim não dá para começarmos o que quer que
seja”, disse o Mulla, profundamente
indignado por aquele povo ignorante fazê-lo perder seu tempo.
Desceu do púlpito e foi para casa. Um tanto vexados,
seguiram em comissão para, mais uma vez, pedir a Nasrudin fazer um sermão na sexta-feira
seguinte, dia de oração.
Nasrudin começou a pregação com a mesma pergunta de antes.
Desta vez, a congregação respondeu numa única voz: “Sim, sabemos!”
“Neste caso não há porque prendê-los aqui por mais tempo.
Podem ir embora”, e voltou para casa.
Por fim, conseguiram persuadi-lo a realizar o sermão da sexta-feira
seguinte, que começou com a mesma pergunta de antes: “sabem ou não sabem?”
A congregação estava preparada.
“Alguns sabem, outros não.”
“Excelente , disse Nasrudin. Então, aqueles que sabem
transmitam seus conhecimento para àqueles que não sabem”, e foi para casa.
(Conto sufi)
Verdade
"Estas leis não tornam melhores as pessoas", disse
Nasrudin ao rei. "Elas devem praticar certas coisas de forma a
sintonizarem-se com a verdade interior, que se assemelha apenas levemente à
verdade aparente."
O rei decidiu que poderia fazer que as pessoas observassem a
verdade e o faria.
Ele poderia fazê-las praticar a autenticidade.
O acesso a sua cidade era feito por uma ponte, sobre a qual
o rei ordenou que fosse construída uma forca.
Quando os portões foram abertos ao alvorecer do dia
seguinte, o capitão da guarda estava postado à frente de um pelotão para
averiguar todos os que ali entrassem.
Um édito foi proclamado: "todos serão interrogados.
Aquele que falar a verdade terá seu ingresso permitido. Se mentir, será
enforcado."
Nasrudin deu um passo à frente.
"Aonde vai?", perguntou o capitão.
"Estou a caminho da forca", respondeu Nasrudin
calmamente.
"Não acreditamos em você!"
"Muito bem, se estiver mentindo, enforquem-me!"
"Mas se o enforcarmos por mentir, faremos com que
aquilo que disse seja verdade!"
"Isso mesmo: agora sabem o que é a verdade: a sua
verdade!"
(Conto sufi)
Sábio
Todos os dias o Mullah Nasrudin ia esmolar na feira, e as
pessoas adoravam vê-lo fazendo o papel de tolo, com o seguinte truque:
mostravam duas moedas, uma valendo dez vezes mais que a outra.
Nasrudin sempre escolhia a menor.
A história correu pelo condado.
Dia após dia, grupos de homens e mulheres mostravam as duas
moedas, e Nasrudin sempre ficava com a menor.
Até que apareceu um senhor generoso, cansado de ver Nasrudin
sendo ridicularizado daquela maneira. Chamando-o a um canto da praça, disse: “sempre
que lhe oferecerem duas moedas, escolha a maior. Assim terá mais dinheiro e não
será considerado idiota pelos outros.”
“O senhor parece ter razão, mas se eu escolher a moeda
maior, as pessoas vão deixar de me oferecer dinheiro, para provar que sou mais
idiota que elas. O senhor não sabe quanto dinheiro já ganhei, usando este
truque. Não há nada de errado em se passar por tolo, se na verdade o que você
está fazendo é inteligente. Às vezes, é de muita sabedoria se passar por tolo e
é muito melhor passar por tolo e ser inteligente do que ter inteligência e usar
fazendo tolices.”
"Os sábios não dizem o que sabem, os tolos não sabem o
que dizem!"
(Conto sufi)
Varal
Um vizinho bateu à porta do Nasrudin e pediu: “ Nasrudin,
você me empresta o varal de secar roupa que o de lá de casa se quebrou?”
“Um momento. Vou perguntar à minha mulher.”
Momentos depois Nasrudin voltou e disse para o vizinho: “desculpe
vizinho, mas não vou poder emprestar o varal pois minha mulher está secando
farinha nele.”
O vizinho, surpreso, exclamou: “mas Nasrudin, secando farinha
no varal??!!”
E Nasrudin respondeu: “É... quando não se quer emprestar o
varal, até farinha se seca nele...”
(Conto sufi)
Olho
Um camponês aproximou-se de Nasrudin e queixando-se de que
seu olho doía, pediu-lhe um conselho.
Então Hodja disse-lhe: “outro dia meu molar doía, e não me
acalmei enquanto não o arranquei.”
(Conto sufi)
Conselhos
Nasrudin começou a construir uma casa. Seus amigos, que
tinham cada um sua própria casa, e eram carpinteiros, pedreiros, o rodearam de
conselhos.
Mulla estava radiante.
Um após outro, e às vezes todos juntos, disseram-lhe o que
fazer.
Nasrudin seguia docilmente as instruções que cada um lhe
dava.
Quando a construção terminou, ela não se parecia em nada com
uma casa.
“Que curioso!, disse Nasrudin. E contudo eu fiz exatamente
aquilo que cada um de vocês me tinha dito para fazer!
(Conto sufi)
Doente
Nasrudin, sentado na sala de espera do consultório médico,
repetia em voz alta: "espero que eu esteja muito doente", o que
intrigava os outros pacientes.
Quando o médico apareceu, Nasrudin repetia quase gritando:
"espero que eu esteja muito doente".
"Por que você diz isso?", perguntou o médico.
"Detestaria pensar em alguém que se sinta tão mal como
eu não tenha nada!".
(Conto sufi)